A coluna Babel de 30/7

BABEL

Raquel Cozer – raquel.cozer@grupoestado.com.br

DIGITAL-1
Entrada da Amazon na Itália estimula queda de preços

Horas antes de Ricardo Cavallero, gerente geral da Mondadori, embarcar para São Paulo – onde participou na quarta do Congresso Internacional do Livro Digital -, a gigante italiana assinou com a Amazon contrato para venda de 2.000 títulos para Kindle. Há nove meses vendendo e-books, a maior editora da Itália pretende lançar no formato outros 1.000 dos 10 mil títulos de seu catálogo até o fim do ano – quando a Amazon, no país desde novembro, deve iniciar a venda do Kindle. “Não houve razão para assinarmos o acordo antes de termos certeza de que eles entrariam no mercado italiano”, disse Cavallero à coluna. Ciente das dificuldades da varejista de fechar contratos no Brasil, o gerente compara a situação aqui com a dos EUA em 2009. “A tendência é que as editoras batalhem pelo direito de definir os preços sem que ninguém possa mudá-los. O problema dessa típica reação de defesa da indústria é que, para que esse mercado dê certo, os preços precisam cair. Está provado que as pessoas gastam no máximo 10 dólares ou euros em compras pelo celular.” Enquanto no Brasil descontos costumam chegar a no máximo 40%, a Mondadori oferece reduçoes de 50% nos preços de todos os seus e-books. Quer reduzir ainda mais os preços até o fim do ano.

DIGITAL-2
Enquanto isso, no Brasil…

Apesar de a Amazon ainda não ter chegado de fato ao Brasil, sua presença no País é significativa entre livrarias virtuais. Segundo o Google AdPlanner, que estima audiência de sites, a loja americana tem aqui mais visitantes únicos por mês (1,9 milhão) que a Cultura e a Fnac (com 1,2 milhão cada uma). A Saraiva fica na frente das três, com 4,6 milhões.

DIGITAL-3
As vendas por aqui

Na Cultura, 15 mil e-books foram vendidos este ano. Mauro Widman, coordenador da área na livraria, diz que as vendas dobram a cada dois ou três meses. A previsão é que, até dezembro, a comercialização de digitais chegue a 1% do faturamento da loja. Parece otimismo: ficaria em torno de R$ 3 milhões, se levado em conta o faturamento de 2010.

*

As editoras que mais vendem livros digitais na Cultura são a KBR, cujos títulos não passam de R$ 12, e a Zahar, devido aos preços e ao alto número de títulos no formato: 300.

*

Os e-books “made in Brazil” não chegam a 2% do total de títulos digitais oferecidos pela Cultura e pela Saraiva. Embora os importados dominem, suas vendas são menos expressivas. Cerca de 70% dos títulos no formato vendidos nas duas lojas são nacionais.

*

Segundo a Saraiva, há dez títulos nacionais cujas vendas em e-book já equivalem a mais de 5% das de papel no mesmo período.

ILUSTRAÇÃO
O Duplo triplo 

A primeira edição da tradução de Paulo Bezerra para o romance O Duplo, de Dostoievski, sai pela editora 34 em agosto com três versões de capa (acima, duas delas), para destacar as ilustrações do expressionista austríaco Alfred Kubin – 26 delas foram publicadas originalmente na edição alemã de 1933 e são agora reproduzidas no interior da edição

 

FEIRA-1
O passado e o futuro

Sai Roger Chartier, entra Bob Stein. Com a mudança de agosto para outubro, a 1.ª Festa Literária Internacional de Cachoeira (Flica) perdeu o francês historiador do livro, mas garantiu o americano pioneiro em estudos sobre e-books. Em comum, os dois creem que o digital vai gerar um novo tipo de obra literária, mas Stein é mais radical. No Congresso do Livro Digital, ele mostrou não ver lugar para o impresso no futuro.

*

A Flica, de 11 a 16/10, também quer ser pioneira. É anunciada como o primeiro evento do gênero “festa literária” na Bahia.

FEIRA-2
Entre a fábula e a farmácia

É curioso o perfil de Alejandro Roemmers, que a Bienal do Livro Rio anuncia na terça entre seus convidados. Membro de poderosa família argentina, ele divide a direção dos laboratórios farmacêuticos Roemmers com a poesia. E seu novo livro é um “complemento espiritual” de O Pequeno Príncipe. Escrito com autorização da família de Antoine de Saint-Exupery, O Retorno do Jovem Príncipe (Fontanar) se passa na Patagônia.

FEIRA-3
A Cabana, três anos depois

No evento carioca, a Sextante espera anunciar os 3 milhões de exemplares vendidos de A Cabana. O romance de William P. Young saiu na Bienal do Livro de 2008, em São Paulo, e já passou os 2,9 milhões.

*

Mas é em outro filão a nova aposta da Sextante. Ela divulgará na feira os primeiros autores de sua linha de autoajuda nacional, editada por Anderson Cavalcante. Reflexos de Ágape (Globo), de Padre Marcelo, que completa um ano, em agosto, perto dos 6 milhões de exemplares vendidos.

Onde estão livreiros e distribuidores no debate sobre o livro digital?

Alguém me diz onde estão os livreiros e distribuidores na discussão sobre o livro eletrônico? A dúvida voltou anteontem entre uma e outra mesa do Congresso Internacional do Livro Digital, quando vi que a programação reservou uma só mesa para tratar do papel de livrarias e distribuidoras nesse cenário. Ontem, o diretor da Sextante, Marcos Pereira, começou a tal mesa pedindo aos livreiros na audiência que levantassem a mão. Eu para fazer estimativas de público consigo ser pior que a Polícia Militar em eventos paulistanos, mas, de, sei lá, umas 300 (chutei) pessoas no auditório, uns 15 gatos pingados, se tanto, se manifestaram. Distribuidores, convocados em seguida, idem. O resto era quase todo de editores.

“Acho curioso que haja aqui um número tão maior de editores que de livreiros e distribuidores, considerando que livreiros e distribuidores estão com a vida tão mais em risco neste momento”, seguiu Pereira. É fato: no processo evolutivo do cenário editorial as primeiras classes em risco de extinção são essas, mas por isso mesmo é estranho que não estejam lá para acompanhar o debate.

Cá entre nós, eu mesma fico cansada com todo esse exercício de futurologia. Às vezes, acho que sou cética demais, para não dizer chata. O falatório hoje me parece bem menos interessante do que quando comecei a escrever sobre o assunto, em 2009. Só que a ideia do congresso é boa. Num contexto geral, entre muita coisa vendida como novidade (diz que a palestra do Bob Stein é a mesma há anos, com pequenas variações), você pesca informações aqui e ali e depois nem se dá conta de que está repetindo dados que ouviu ontem como se fizessem parte da bagagem cultural conquistada na primeira infância.

Na comparação com o congresso do ano passado, editores parecem menos receosos, pelo que se pode apreender das perguntas feitas pelo público. Um pouco só. Não que estejam mais animados; parecem apenas menos preocupados após tanto falar desse tema que demora a engrenar. Em 2010, a grande questão, colocada com pequenas variações, era: “Como lucrar?”. Neste ano, houve até gente no público questionando a necessidade do DRM, a tecnologia que limita o uso de conteúdo digital para assegurar direitos autorais. Aos editores com quem falei, mais que o medo de verem o impresso ser engolido pelo digital, incomoda o alto investimento em algo que não dá retorno, porque quase não tem público no Brasil.

Livreiros e distribuidores tradicionais, no entanto, eu não faço ideia do que pensam. Digo isso sem considerar as megastores, que mesmo no e-comerce entraram faz algum tempo, e empresas criadas já com foco na distribuição digital – uma das maiores do país, a DLD, por exemplo, é cria de editores, não de distribuidores. Um dos palestrantes do congresso, o americano Edward Nawotka, editor do Publishing Perspectives, comentou que também nos EUA os mais antigos no ramo evitam a discussão. É claro que meu coração de leitora, fetichista por estantes, espera que as lojas físicas durem. Que virem pólos culturais, com pockets shows e leituras de autores entre ilhas de livros, como especulou dia desses um editor. Mas achei significativa a questão, feita ao fim da palestra, por um dono de livraria independente, ainda que qualquer resposta caia na futurologia: “As livrarias têm realmente um papel no futuro do livro?”

Somos muitos Severinos. Em 3D

A semana passou tão apressada na minha vida que não tinha visto o vídeo dessa linda animação de Morte e Vida Severina, do João Cabral de Melo Neto, citada no texto da Flavia Guerra sobre o Anima Mundi.

Foi feita a partir das ilustrações de Morte e Vida Severina em Quadrinhos, livro de Miguel Falcão lançado sem alarde em 2006 pela pequena Massangana. Não li a HQ, mas as ilustrações, fora de série, ficaram melhores ainda animadas em 3D. A direção é de Afonso Serpa, o personagem central foi dublado Gero Camilo, a trilha sonora ficou a cargo de Lucas Santtana e Rica Amabis e o resto dos créditos vocês que ainda não viram façam o favor de ver no vídeo.

[kml_flashembed movie="http://www.youtube.com/v/P8yeAHVP8MQ" width="425" height="350" wmode="transparent" /]

O filme, de 56 minutos, teve exibição no Anima Mundi hoje, terá outra amanhã (às 13h, no CCBB-SP) e depois será lançado num combo graphic novel + DVD.

No YouTube, dá pra continuar vendo aqui, aqui e aqui. E tem também o making of.

O fim das marginálias? Uma alternativa a elas, talvez

“Eu posso fazer anotações nas margens dos meus livros – e compartilhá-las em redes sociais.”

Esse vídeo eu queria postar aqui desde que foi exibido no seminário sobre livros eletrônicos da Feira do Livro de Londres, mas, é claro, esqueci assim que coloquei os pés fora do auditório. Acabou de ser exibido no segundo Congresso Internacional do Livro Digital, que estou acompanhando em São Paulo, então resolvi pôr aqui antes que a lembrança escapasse mais uma vez.

A frase que abre o post, tirada do vídeo, é uma resposta a quem vê nos e-books a ameaça do fim das tão amadas marginálias. (Não sei se o fim da marginália me preocupa tanto, mas confesso que, vendo toda essa gente aqui fazendo anotações em netbooks e iPads – eu trouxe meu laptop gigante de casa, praticamente um PC dobrável – fico pensando se eles não sentem falta de rabiscar desenhos em bloquinhos enquanto os homens falam lá na frente…)

O vídeo, enfim. É propaganda, obviamente, mas vale dois minutos da sua vida. Quer dizer, eu acho.

[kml_flashembed movie="http://www.youtube.com/v/Z5G6yTOWhdE" width="425" height="350" wmode="transparent" /]

A coluna Babel de 23/7

[Publicada no Sabático de ontem. Sorry, mas precisava mencionar o quão bizarra achei a coincidência do assunto da última nota, justo no dia da morte da Amy.]

BABEL

Raquel Cozer – raquel.cozer@grupoestado.com.br

NEGÓCIOS
Novas apostas portuguesas em interesse geral e didáticos

“Chegamos antes da Leya e da Babel, mas elas aparecem mais. A meta é fazer barulho”, diz Márcio Coelho, diretor-geral da portuguesa Almedina. O brasileiro assumiu em janeiro para ampliar o leitorado da casa, instalada em São Paulo desde 2005 e hoje com 4.000 títulos no catálogo, quase todos jurídicos e de ciências sociais. Mês que vem, a Almedina passa a colocar no mercado títulos de interesse geral, começando com Entrevistas do Centro do Mundo (parceria com a Prime Books), de Henrique Cymerman, prefaciado por FHC. Outras aquisições são o novo livro do cronista esportivo Orlando Duarte, a ser lançado até o fim do ano, e a obra de Miguel Paiva, cujos títulos Gatão de Meia Idade e Radical Chique saem a partir de 2012. Enquanto isso, o bem-sucedido grupo Leya estende os braços para os didáticos, com a estreia em setembro da Leya Escolar, dirigida por Vicente Paz. O ambicioso projeto envolve livros, plataformas digitais e serviços, como treinamento de professores. Mais devagar, a Babel, lançada em março, tem só dois títulos nas livrarias.

 

Multilíngue: O clássico alemão O Aprendiz de Feiticeiro, de Goethe, sairá pela italiana Donzelli com as ilustrações que Nelson Cruz fez para a edição brasileira em 2006; da Cosac Naify, a Donzelli também já comprou desenhos de Guazelli

 

BIENAL
Leituras pop

José Wilker e Marcelo Anthony são dois dos 11 nomes confirmados para o Livro em Cena, série de leituras que a Bienal do Livro Rio promove de 4 a 11 de setembro – e que foi um dos maiores sucessos da última edição. Wilker lerá trecho de Triste Fim de Policarpo Quaresma, de Lima Barreto; e Anthony, Seis Crônicas, de Rubem Braga.

*

Mas foi um poeta, e não um global, quem exigiu maior esforço do diretor artístico, Gabriel Villela. Ele e o adjunto, Dib Carneiro Neto, não desistiram até convencer o amazonense Thiago de Mello a liberar a leitura de Os Estatutos do Homem e Outros Poemas. Ficará a cargo do xará Thiago Lacerda.

*

Villela ainda conseguiu da família de Portinari autorização para reproduzir no cenário um enorme Dom Quixote de Cócoras.

 

THRILLER
Dan Brown à francesa

Mestre do thriller francês, mais vendido por lá que Dan Brown na época de O Símbolo Perdido, Henri Loevenbruck vem ao Brasil para dois eventos, o Fórum das Letras de Ouro Preto e a Feira do Livro de Porto Alegre. Fala sobre A Síndrome de Copérnico, que saiu pela Bertrand Brasil em julho.

CINEMA-1
Do papel para a tela…

Vão virar filme as memórias Retrato de Um Viciado Quando Jovem, em que o agente literário Bill Clegg relatou seus tempos de dependência de crack. A produção será do próprio autor – cujo próximo livro, aliás, também foi comprado pela Companhia das Letras. 90 Days sairá em abril pela Little Brown e abordará a recuperação do vício.

CINEMA-2
…da tela para o papel…

Inside Job, o documentário vencedor do Oscar de 2011, se tornará livro pelas mãos do diretor do longa, Charles Ferguson. A versão impressa da história da crise econômica de 2008 sai nos EUA no primeiro semestre de 2012 e depois por aqui, pela Zahar.

CINEMA-3
…e tudo ao mesmo tempo

Em outubro, quando entrar em cartaz no Brasil a comédia romântica What”s Your Number, a Novo Conceito põe no mercado o livro que a inspirou, de Karyn Bosnak. A versão cinematográfica tem no papel central Chris Evans – protagonista do novo Capitão América, que estreia semana que vem.

ESTREIA-1
Teju Cole no Brasil

Ficaram com a Companhia das Letras os direitos de Open City, o elogiado romance de estreia de Teju Cole. A editora fechou nesta semana contrato para publicar a obra do americano criado na Nigéria, tema da reportagem de capa do Sabático no último sábado. A trama, protagonizada por um nigeriano na Nova York pós-11/9, levou o escritor de 36 anos a ser comparado a Camus.

ESTREIA-2
A maldição do 27

Cantor de rock famoso na Alemanha, Kim Frank passou ileso pelos fatídicos 27 anos – idade com a qual morreram Kurt Cobain, Jim Morrison, Janis Joplin e outros ídolos – e tirou proveito disso. Hoje com 29 anos, o também ator e diretor publicou há pouco seu primeiro romance, chamado 27, sobre um roqueiro que perde o rumo da carreira à medida que se aproxima a tão temida idade. O livro sai em 2012 pelo Tordesilhas.

A fantástica fábrica de livros

Em abril, eu estava em Londres tentando descobrir alguma novidade no blablablá sobre livro digitais que antecedeu a London Book Fair quando um diretor da Bloomsbury falou a única coisa bombástica de todo o seminário: “O enhanced ebook morreu”. Era ou isso ou que o enhanced ebook estava dando os últimos suspiros, já não lembro. (Tá, talvez não tenha sido tão bombástico assim.)

Foi curioso porque os enhanced ebooks, ou apps de livro para iPad, enfim, esses livros interativos cheios de firulas de áudio e vídeo e interação para atrair quem não gosta tanto assim da leitura stricto sensu (ou para distrair quem só faz de conta que está lendo) tinham sido assunto longamente debatido em 2010 em sites americanos e ingleses. E fazia só dois meses que eu tinha escrito uma reportagem de capa para o Sabático sobre as primeiras investidas de editoras brasileiras no formato – todas as citadas ali tateando, gastando uma grana, sem saber se a coisa daria certo.

Era uma declaração exagerada a do diretor da Bloomsbury, mas ajudou a pôr uns pingos nos is. Os enhanced ebooks não iam mesmo acabar duma vez só com os livros de papel e os eletrônicos normais, como quiseram comentaristas mais apocalípticos. Mas representavam a descoberta de um novo nicho, em especial para crianças, que agora vem sendo explorado com menos, eu diria, deslumbramento.

Digo tudo isso por causa de um link que o Alexandre Rampazo me mandou ontem, do app para iPad baseado no The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore. O vídeo que originou o aplicativo é um curta animado do fim do ano passado, vendido a US$ 1,99 na iTunes Store. É inspirado “em iguais medidas no furacão Katrina, em Buster Keaton, no Mágico de Oz e no amor pelos livros”, e nele o personagem-título, apaixonado pela leitura, perde toda a biblioteca num furacão. O trailer:

[kml_flashembed movie="http://www.youtube.com/v/-Ncx0CYTWtU" width="425" height="350" wmode="transparent" /]


Ilustrada por William Joyce (capista da New Yorker e ex-criador da Pixar e da Dreamworks cheio de prêmios Emmy) e produzida pela Moonbot, a história voltou a ser falada agora que saiu o aplicativo, a US$ 4,99 na App Store. O fato importante sobre o app do The Fantastic Flying Books of Mr. Morris Lessmore é que, a se considerar resenhas de sites especializados, ele é o primeiro “next big thing” de verdade no universo de possibilidades do ebooks 2.0 desde o de Alice no País das Maravilhas, de maio de 2010.

Aqui no Brasil, quem já  testou o novo aplicativo foi o Almir de Freitas, mas tem também o trailer do aplicativo para dar a dimensão:

[kml_flashembed movie="http://www.youtube.com/v/z38EdtRHlnA" width="425" height="350" wmode="transparent" /]

Acho que o segredo fica resumido nesta frase do crítico do New York Times: “As interações são feitas com o toque de um narrador, então elas em geral servem à narrativa em vez de tirar a atenção dela.” É que, pelo que tenho visto, é comum o conteúdo extra dos enhanced ebooks não agregar nada à narrativa em si. Só que o NYT esclarece: é divertido para um adulto, mas, como experiência de leitura, não é recomendado para mais que uma criança de sete anos.

E é preciso fazer outra ressalva aí. Ao contrário do app de Alice, que nasceu de um livro, o aplicativo de Mr. Morris Lessmore é baseado em um vídeo. Parece que vai virar livro de papel, também, mas só de ilustrações –  como acontece com tantos filmes animados da Disney, por exemplo. Por que ele é chamado de aplicativo de livro, e não de filme, isso já fica fora da minha capacidade de compreensão.

Uma livraria "fora do comum"

“Essa livraria de design impecável em São Paulo parece ser feita basicamente de livros. As portas dianteiras são estantes funcionais e as paredes são revestidas do piso ao teto com livros para onde quer que se olhe – inclusive, hm, em buracos no teto para espaço extra. Embora esta seja uma das livrarias conceitualmente menos bizarras desta lista, achamos que a estética do design forma-segue-função-segue-forma é bem instigante. Ademais, é preciso admirar uma livraria que coloca um livro em cada espaço possível e ainda consegue parecer um lugar iluminado e limpo.”

Ok, enquanto ainda estou devendo aquele post com as fotos de livrarias nacionais, o Flavorwire, que adora listas, tratou de colocar uma loja brasileira, a paulistana Livraria da Vila – Unidade Lorena, numa seleção de dez casas não convencionais mundo afora.

Quem deu a dica foi Rodrigo Levino, natural born Caçambito.

Update em 20/7: A leitora Ana Paula reclamou, com razão, que não dei o crédito do projeto da Livraria da Vila. É do conhecido arquiteto paulistano Isay Weinfeld.

 

As colunas Babel de 9 e 16/7

[Publicadas no Sabático]

BABEL (16/7)

Raquel Cozer – raquel.cozer@grupoestado.com.br

DIGITAL-1
Estreia em e-books com promessa de preços baixos

A Novo Século, que tem no catálogo best-sellers como O Sete, de André Vianco, demorou a começar a vender e-books, mas estreia no segmento nos próximos dias com a promessa de preços bem mais baixos que os do mercado. Enquanto grandes editoras costumam oferecer livros digitais com descontos de no máximo 40% em relação aos impressos, a casa de Osasco diz que os seus custarão até 75% a menos – caso dos títulos da Coleção Virginia Woolf, que em papel chegam a R$ 39,90 e ficarão por R$ 9,90 cada um. “Queremos ganhar mercado pelo preço. Creio que os e-books ajudarão inclusive a divulgar os títulos impressos”, diz Cleber Vasconcelos, responsável por novos negócios na editora. A meta é oferecer em três meses 80% do catálogo de 510 livros nos formatos ePub ou PDF. A saber se a casa conseguirá fazer com que “exceções”, como a série House of Night – que terá desconto de apenas 37% na versão ePub -, não virem regra.

DIGITAL-2
No topo da lista

Com e-books custando no máximo R$ 12, a pequena KBR tem ficado no topo nas listas de mais vendidos. Há dez semanas, Domingo, O Jogo, de Cassia Cassitas, passou a liderar a da Cultura. Está prestes a atingir 2 mil cópias comercializadas, um feito para um e-book no Brasil – considerando que, por exemplo, há três meses o título Estrela Brasileira, também da KBR, ficou em primeiro com apenas 17 downloads numa semana.

DIGITAL-3
Autores independentes

O sistema de self publishing da Singular Digital, em fase beta há um ano, será uma prioridade da empresa daqui para a frente. Para reforçar os trabalhos nesse sentido, a Singular passará a permitir aos autores independentes publicar em e-book, além de imprimir por demanda. O trabalho fica a cargo de Carlo Carrenho, recém-contratado como diretor executivo, em equipe reforçada ainda pelo diretor de negócios João Casacio.

TRADUÇÃO
O Enigma em turco

O Enigma de Qaf, romance em que Alberto Mussa investiga o árabe, virou capa do suplemento literário do Vatan (A Nação), na Turquia, onde acaba de ser lançado. “É uma sorte mágica poder ler o livro de Alberto Mussa em turco”, avalia o texto.

*

A obra sai em setembro na Romênia e foi vendida à Argentina e ao Egito, totalizando sete países. Também em setembro, O Movimento Pendular sai na França com tradução de Stephane Chao, agente de Mussa.

BANCAS
Investimento no popular

Os três recentes títulos da Coleção Mitologia Superinteressante (Deuses, Heróis e Lendas) representam nova aposta da Abril no mercado de livros populares, usando a lógica da venda de revistas: tiragem alta (12 mil por volume), distribuição nacional e em bancas. Se as vendas forem expressivas, a revista deve passar a ter uma “editora Super”.

QUADRINHOS
Entre a tira e a piada

O especialista em quadrinhos Paulo Ramos dedicou o doutorado a responder a uma pergunta que, num primeiro momento, parece simples: se tiras de jornal são uma forma de piada. O resultado, defendido em 2007, sai em agosto em livro pela Zarabatana. Faces do Humor: Uma Aproximação Entre Piadas e Tiras exigiu do autor longa investigação sobre as linguagens dos dois gêneros, piadas e tiras, analisando trabalhos como As Cobras (acima), de Luis Fernando Verissimo.

MÚSICA-1
Os reis do mambo

O mais recente romance do Pulitzer de ficção Oscar Hijuelos, Beautiful Maria of My Soul, foi comprado pela Livros de Safra. A trama é centrada na musa de The Mambo Kings Play Songs of Love, o romance que rendeu a Hijuelos em 1990 aquele inédito prêmio para um hispânico. The Mambo Kings, que originou o filme Os Reis do Mambo, com Antonio Banderas, saiu em 1989 pela Objetiva e agora também pertence à jovem casa.

MÚSICA-2
O rei do soul

Ainda em fase de elaboração, The One, Life and Music of James Brown, do editor sênior da Los Angeles Magazine J.R. Smith, teve os direitos comprados pela Leya. A editora pretende publicá-lo em março, junto com a edição original – para qual o selo Gotham, da Penguin, prepara megalançamento.

***

BABEL – 9/7

CONGRESSO
Olhar acadêmico sobre livro digital

O novo papel do designer na elaboração de e-books e os fatores que influenciam a prontidão do leitor potencial na adoção da tecnologia eletrônica são dois dos temas de trabalhos que concorrem a prêmio do 2º Congresso Internacional do Livro Digital, marcado para os próximos dias 26 e 27 em São Paulo. Criado com a intenção de ampliar a discussão acadêmica em torno do assunto, o concurso atraiu apenas dez estudos, dos quais cinco foram selecionados para concorrer aos dois prêmios, de R$ 1.000 e R$ 500, que serão anunciados durante o evento. Outros temas selecionados para a final foram um estudo de como o formato estimula a democratização do acesso à produção científica e duas pesquisas de campo realizadas no mesmo Estado: um diagnóstico de como estudantes da Universidade Federal da Bahia lidam com livros oferecidos de graça na internet e uma investigação de como o e-book se torna instrumento de estudo entre alunos do Instituto Federal de Educação da Bahia.

HISTÓRIA
O descobrimento…

Recém-saído da presidência da Biblioteca Nacional portuguesa, Jorge Couto vem à Bienal do Livro Rio, em setembro, lançar pela Forense obra já clássica em Portugal: A Construção do Brasil, de 1995, que defende a descoberta do País em 1498, com base em texto desaparecido por quase 400 anos.

EXPORTAÇÃO
…e o esquecimento do Brasil

“Até maus autores hispânicos são publicados facilmente em Portugal, enquanto bons brasileiros têm dificuldades”, disse à coluna o angolano valter hugo mãe, antes de sua mesa ontem na Flip. A explicação, imagina, está na força histórica da literatura em língua espanhola em Portugal e na expectativa de editores de reproduzir no país o sucesso de obras do vizinho.

*

O autor veio ao Brasil com Alexandre Vasconcelos e Sá, diretor-geral da Alfaguara, que o edita por lá. Sá dedicou parte de seu tempo em Paraty a fazer enquetes com gente do meio editorial, em busca de jovens escritores brasileiros que a editora possa “dar a conhecer aos leitores portugueses”.

DIREITOS
Mercado de língua inglesa

Um dos estrangeiros convidados da Apex-Brasil a Paraty, o agente literário Jonah Strauss negociou nos últimos dias a venda de títulos nacionais para grandes e pequenas editoras de língua inglesa. Estação Carandiru (Companhia das Letras), de Drauzio Varella, por exemplo, sai pela gigante Simon & Schuster UK.

*

Já Paulo Emilio Sales Gomes e Lygia Fagundes Telles, que foram casados até a morte dele, em 1977, chamaram a atenção da pequena Dalkey Archive, conceituada editora independente norte-americana. A editora vai publicar Três Mulheres de Três PPPs (Cosac Naify), de Paulo Emilio, e As Meninas (Companhia das Letras), de Lygia.

DEDICATÓRIA
Prêmio de consolação 

Rubem Fonseca não quis ir ao lançamento de seus próprios livros em Paraty, os inéditos José e Axilas e Outras Histórias Indecorosas, mas guardou presente para fãs: na quarta-feira, no Rio, ele assinou 200 cópias, que serão distribuídas a princípio em livrarias do Rio e de São Paulo, ainda não definidas. A Nova Fronteira prepara uma campanha para a internet pós-Flip.

POLÍTICA-1
Blog impresso

O célebre artista dissidente chinês Ai Weiwei (acima, com a obra Sunflower Seeds, na Tate), libertado pelo governo de seu país no fim de junho após três meses de prisão, terá os textos que escreveu para seu blog de 2006 a 2009 publicados no Brasil pelo selo Martins da editora Martins Fontes. Sairá com o nome Blog de Ai Weiwei, ainda sem data definida.

POLÍTICA-2

Enfim, o Irã no papel

Já tem data a publicação no Brasil da versão imprensa da HQ Zahra’s Paradise (imagem), veiculada em capítulos na internet desde fevereiro de 2009, em vários idiomas. A história do desaparecimento de Mehdi, jovem ativista iraniano, sai em outubro pela Leya.

MÁGICA
Como funciona a ilusão

Os neurologistas Stephen L. Macknik e Susana Martinez-Conde convenceram ilusionistas a revelarem segredos de suas técnicas para o livro Truques da Mente, que sai em setembro pela Zahar. A partir disso, contam como funciona o cérebro quando você é tapeado ou cai no papo de um vendedor.

Planos da Alfaguara para Quintana

Logo que a Sonia Racy deu, sucintamente, na Direto da Fonte de ontem, a informação de que a obra de Mário Quintana passaria para a Alfaguara, ligamos lá pedindo detalhes. Quintana é um nome enorme para qualquer catálogo, não apenas como prestígio mas também em possibilidades de comercialização, consideradas vendas para escolas e em antologias, entre outras. Mandamos uma série de perguntas para Isa Pessoa, diretora editorial da Objetiva, que preferiu mandar uma mesma resposta a todos os jornalistas.

A Editora Globo, que teve Quintana como funcionário e onde ele era publicado, preferiu não se pronunciar, assim como Lucia Riff, agente literária responsável pela obra do poeta gaúcho, que chegou só a dar umas aspas ontem para o Publishnews.

As obras a sair pela editora são: A Rua dos Cataventos (1940), Canções (1946), Sapato Florido (1948), O Aprendiz de Feiticeiro (1950), Espelho Mágico (1951), Caderno H (1973),  Apontamentos de História Sobrenatural (1976), A Vaca e o Hipogrifo (1977), Esconderijos do Tempo (1980), Antologia Poética (1985), 80 Anos de Poesia (1986), Baú de Espantos (1986), Da Preguiça como Método (1987), O Batalhão de Letras (1987), Preparativos de Viagem (1987),  Porta Giratoria (1988),  A Cor do Invisível (1989), Velorio sem Defundo (1990), Poemas para Ler na Escola – Mário Quintana.

Sobre Quintana na Alfaguara, então, os principais pontos do texto de Isa Pessoa:

 

“Esperamos ampliar a presença do poeta nas escolas, apostando (…) (no) relançamento de sua obra nas livrarias, e também no formato digital”

“São 19 títulos, uma obra vasta (…) que será relançada a partir de meados do ano que vem.”

“Planejaremos esse cronograma (…) em conjunto com especialistas no autor, sempre ouvindo a Elena Quintana, sobrinha do poeta e conhecedora profunda da sua obra, e também sua agente, Lúcia Riff. A obra completa sairá pela Alfaguara, mas pretendemos explorar possibilidades editoriais novas, publicando alguns títulos pelo selo Objetiva.”

“Vamos trabalhar para estabelecer um projeto gráfico elegante, capas cheias de luz e cor (…).”

“Nossa ideia inicial, ainda sujeita a alterações, é iniciar a série com dois lançamentos simultâneos. O primeiro: a Antologia Poética, clássico do autor, editada por Rubem Braga e Paulo Mendes Campos nos anos 60. A meta é fazer um resgate da edição original, assinada por dois titãs da literatura brasileira, sem intermediários – recuperando ainda a fortuna crítica da época (a antologia foi publicada em homenagem aos 60 anos do autor, junto a uma célebre saudação feita em sua homenagem na Academia Brasileira de Letras, onde Quintana, por mais inacreditável que pareça, nunca foi eleito imortal). ”

“Com o título provisório No Retrato Que Me Faço, primeira linha de um poema do autor, o outro volume de estreia será cria.do a partir de frases e haicais do poeta, famoso por suas tiradas anticonvencionais, em que nunca perdoava os chatos nem o tédio de existir”

“Sob o selo Objetiva, esperamos incluir um volume de Quintana em nossa coleção Para Ler na Escola. Criada há cerca dois anos, a série tem tido um desempenho extraordinário nas escolas, reunindo contos, poemas ou crônicas de autores que são referência em seu gênero (…) . Mario Quintana – Poemas Para Ler na Escola, será organizado e apresentado, seguindo a estrutura da coleção, por curadoras  irretocáveis como Marisa Lajolo e Regina Zilberman.”

O dia de Emma e Dexter

Peguei One Day, de David Nicholls, para ler uns meses antes de sair por aqui. Enfiei na mala quando fui para Londres, porque tenho essa mania de legendar viagens com referências literárias locais, e a primeira coisa que nosso anfitrião disse quando abri o livro no metrô londrino foi:  “Mas qual é a dessa história? Por que tá todo mundo lendo isso?”

Acho que, das pessoas que conheço que leram Um Dia (aqui saiu pela Intrínseca), sou a menos entusiasta. É um bom livro, fluente, leitura divertida, boas sacadas, mas confesso que fiquei ali tentando entender por que se tornou tão cult em tão pouco tempo na comparação com outros do gênero. O fato é que vendeu 2 milhões de exemplares no mundo, recebeu elogios de críticos e escritores em vários países e, agora em agosto, vai virar filme, dirigido pela Lone Scherfig (diretora também do ótimo Educação).

A história toda do romance se passa num 15 de julho, como hoje (a propósito de digressão, ouvi mais cedo na rádio Estadão que dia 15 de julho é Dia Internacional do Homem, mas só no Brasil – um dia internacional nacional é dessas coisas que só aqui mesmo). Como ainda não tinha escrito sobre o romance no jornal, e achava que por várias razões ele merecia ser comentado, aproveitei a data para entrevistar Nicholls sobre o livro e o filme, do qual ele é roteirista.

Segue o texto que saiu hoje no Caderno 2, abaixo do trailer do longa.

 

[kml_flashembed movie="http://www.youtube.com/v/GU4qLmIXbOE" width="425" height="350" wmode="transparent" /]

 ***

É hoje o dia

Raquel Cozer – O Estado de S.Paulo

Há exatos 23 anos, numa sexta-feira, 15 de julho, Emma Morley e Dexter Mayhew se conheceram. Ok, o registro pode não parecer importante, até porque Emma e Dexter nem existem de verdade, mas para milhões de pessoas no mundo a data ganhou jeito de efeméride desde que, dois anos atrás, chegou às livrarias inglesas o romance Um Dia, de David Nicholls – lançado por aqui em maio passado, pela Intrínseca.

A data aparece logo no topo da primeira página, quando os recém-formados Emma e Dexter passam no apartamento dela uma noite não propriamente romântica. E o dia 15 de julho volta a cada capítulo, sempre um ano após os acontecimentos do capítulo anterior, em relatos sobre como transcorreram as vidas de ambos ao longo de duas décadas.

Dito assim, não parece mais que romance água com açúcar, mas o texto do ficcionista e roteirista David Nicholls, ágil e cheio de referências da recente história e cultura britânica, tornou a obra quase unanimidade entre público e crítica – elogios do Guardian, do Independent e de outros jornais, e de autores como Jonathan Coe e Nick Hornby aparecem estampados na capa e nas primeiras páginas das edições inglesa e nacional, para que ninguém fique na dúvida.

Desde 2009, Um Dia teve 2 milhões de cópias vendidas em 34 idiomas – no Brasil, foram quase 40 mil em dois meses. E a trama alcançará público ainda mais abrangente daqui a um mês, quando estreia nos EUA Um Dia, o filme, com direção de Lone Scherfig (de Educação), Anne Hathaway e Jim Sturgess nos papéis centrais e roteiro de Nicholls.

“Nunca achei que pudesse virar filme. Achava que era extenso demais, caro demais, que seria um desafio encontrar atores que pudessem ter tanto 22 quanto 42 anos”, disse Nicholls por telefone ao Estado, duas semanas atrás, interrompendo um passeio de bicicleta pela Londres que é praticamente uma personagem no romance. Experiente no trabalho de transportar histórias alheias para a tela (e mesmo suas, caso do menos bem-sucedido Starter for Ten), Nicholls admite que foi sofrido abrir mão de trechos da narrativa. “Num romance, você se dá ao luxo de construir monólogos internos, fluxos de pensamento. Não há equivalente para isso na tela. Tive de cortar alguns dos meus momentos favoritos, linhas de raciocínio, emoções. O livro também tem capítulos na forma de cartas, que não ficam bem no filme, porque a voz em off não fica bem se usada em demasia. Uma vez que aceitei que teria de me concentrar mais em eventos que em descrições, foi divertido trabalhar nisso”, diz.

O filme, segundo Nicholls, tem também menos momentos soturnos que o livro. Um dos melhores capítulos do romance, por exemplo, o filhinho de papai Dexter Mayhew atravessa sob o efeito flashback das drogas que tomou numa festa. A depressão e a euforia decorrentes disso se somam à lembrança de que precisa visitar a mãe, com câncer terminal, e à percepção do quão superficial é sua vida como apresentador de TV. “No filme, com uma passagem tão acelerada do tempo, não ficava bem estender tanto momentos depressivos. Longos capítulos do livro precisaram ser resumidos a cenas de dois a três minutos, enquanto outros chegam a 16 minutos.”

Mas é com Emma, e não com o personagem masculino, que o autor se identifica. Enquanto Dexter vem de uma família rica e não tem grandes ambições além de alimentar a vaidade, Emma é nascida num lar de classe média e carrega consigo os clássicos planos juvenis de salvar o mundo. O processo de amadurecimento de ambos torna o romance mais interessante já uns bons capítulos depois do começo.

Nos primeiros capítulos, como admite o romancista, os dois “são jovens com princípios e ideias muito pouco maleáveis”. “O interessante de criar essa história foi permitir que os personagens mudassem ao longo dos anos, como nós mudamos na vida real, mas que ao mesmo tempo fossem reconhecíveis”, diz Nicholls. “A imagem que eu tinha na cabeça ao escrever o romance era como a de olhar um álbum de fotos: a roupa muda, o cabelo muda, mas o sorriso, o olhar, alguma coisa continua lá.”

QUEM É
DAVID NICHOLLS
ESCRITOR E ROTEIRISTA

O britânico, de 44 anos, formou-se em dramaturgia e inglês em Bristol antes de ser ator em Nova York. Estreou como roteirista adaptando Simpático, de Sam Shepard, ao cinema. Levou à telona ainda outros romances próprios, como Starter for Ten, antes de escrever e roteirizar Um Dia.

***

 

HQ e tecnologia

Tá virando mesmo moda isso de tirinhas em GIFs animados na web, não? Essa aqui, do fim do mês passado, é a primeira do gênero da excepcional série Mimi & Eunice, de Nina Paley (que, por sinal, vem discutindo com certa frequência os direitos autorais em tempos digitais, em tiras como essa e essa).

Divagações pós-Flip

Entrevista coletiva com Antonio Candido, na quarta de manhã. Para mim, valeu toda a Flip (eu tô no chão à esquerda da imagem, dá para ver só o meu cabelo...)

Pausa para um chá com torradas e geleia de pimenta verde. Não chega a ser folga, já que tenho dois livros a ler para uma entrevista depois de amanhã, mas é um alento esticar as pernas depois de uma cobertura como a nossa, com equipe reduzida e meios ampliados – além do impresso, do blog e do Twitter, ainda teve o Bira fazendo três entradas por dia na rádio Estadão ESPN, a primeira delas às 6h30 da manhã. Por sorte, o fotógrafo que foi com a gente, o Wilton Junior, teve a sacada de levar também uma câmera de vídeo e fez, no improviso, as vezes de TV Estadão, garantindo, por exemplo, os vídeos com histórias do Antonio Candido antes da participação dele na mesa de abertura. Para repetir uma expressão que ouvi durante a Flip, diria que foi uma equipe de poucos e bons (foram também o Toninho e o Ivan Marsiglia, que ficaram mais focados em especiais. A Laura Greenhalgh foi como mediadora da mesa do Nicolelis e do Pondé e, solidária, acabou dando uma forcinha no blog no fim de semana).

Sérgio Rodrigues já fez no Todoprosa um post bem contundente sobre o grande baixo e o grande alto desta Flip, então disso eu vou me abster. Mas pensei que, antes de abandonar o assunto e enfrentar a pilha de livros lá na Redação, valia ainda escrever sobre algo que me chamou a atenção nesta edição.

Acho que daria pra resumir num título de release que o Delfin tuitou: “Pela primeira vez, literatos e críticos terão cadeiras Herman Miller durante os debates”. O caráter comercial em torno da coisa cresceu de um jeito que tem uma parte da “nova Paraty” – ou sei lá como chama aquele lindo novo passeio ao lado do canal – que lembra os estandes das Bienais do Livro. Aquele tanto de anúncio paralelo, gente e empresas querendo aparecer, ida de ministra, tudo aquilo contribuiu para o meu cansaço de uma forma que até de pensar em contar dá preguiça. Ok, você vai me dizer que é bom que empresas invistam num evento literário e você pode estar certo, olhando a situação só até a parte em que se fala de investimento e não de pura tentativa de pegar carona em prestígio. Só me deem o direito de achar que podia ser menos ostensivo.

(Aqui preciso abrir um parêntese para comentar o quanto gostei da mudança da Tenda do Telão para o lado de fora do centro histórico. Ao migrar para o fim do passeio ao lado do canal, ele levou a Flip à praia. Vi a mesa do Ubaldo de lá, à beira de um quiosque, esperando para tomar minha cervejinha enquanto tuitava as melhores frases, e cercada de gente espalhada pela areia. O chato foi só que o vento do litoral obrigou a tenda a ficar com um dos lados fechados, reduzindo a capacidade do público não-pagante.)

Tinha pensado em falar neste post também das mediações, essa função difícil e ingrata que é tipo juiz de partida de futebol; se for bem, pouca gente percebe, mas, se for mal, o povo cai matando. Teria coisas a dizer sobre essa tênue fronteira entre falar bem e falar demais. Mas tenho amanhã essa sabatina com o valter hugo mãe em São Paulo, e não sou lá muito experiente como mediadora, então deixo para fazer quaisquer comentários depois, se ainda quiser voltar ao assunto.

Entrevistas pré e pós-Paraty

Esta caótica semana literária que, ufa, está acabando começou com a exibição do Roda Viva com o angolano José Eduardo Agualusa, da qual participei como entrevistadora convidada (ou ao menos tentei) junto com a Francesca Angiolillo, editora adjunta da Ilustrada. Vocês finjam que não dá para perceber que eu estava sem jeito até não dar mais. E não quero falar sobre bochechas.

[kml_flashembed movie="http://www.youtube.com/v/NBjDdMxPVcg" width="425" height="350" wmode="transparent" /]

(Achei no YouTube só o primeiro bloco, mas dá para ver os outros no site da TV Cultura)

E, para completar este post angolano* (e também começar uma nova caótica semana literária), aproveito para lembrar que na terça-feira participo do 34 Leituras Íntimas, sabatinando o escritor-sensação da Flip, valter hugo mãe. Pra quem não veio a Paraty, digo que vale muito a pena ouvi-lo falar. Pra quem veio ou viu pela internet, olha, assuntos que ficaram de fora da mesa dele na Tenda dos Autores podem render.

* valter hugo mãe é descrito como “português nascido em Angola”, porque mora desde muito novo em Portugal, e saiu de Angola quando o país ainda era colônia portuguesa.

Durante esta semana…

… eu tô mais por aqui, no blog do Estadão na Flip.

Um bate-papo com Danilo Beyruth

Em 2010, convidada a participar de votações das melhores HQs do ano pelo Telio Navega, do Gibizada, no Globo, e pela revista pernambucana O Grito, descobri que uma graphic novel lembrada por quase todos os votantes, e que acabou no topo das duas listas, eu não tinha lido: Bando de Dois (Zarabatana), do Danilo Beyruth. Taí um dos motivos pelos quais rankings e eu não nos damos muito bem, mas, enfim, agora, com o livro devidamente acomodado na estante, posso dizer que é um belo trabalho.

Na semana passada, o Bira, editor do Caderno 2, perguntou se eu podia fazer para a edição de hoje a seção Mesa para 2, um bate-papo informal com algum artista durante algum almoço ou jantar em lugar escolhido pelo entrevistado. Lembrei do Beyruth, fiz o convite e ele sugeriu o ótimo Bueno, na Liberdade.

Foi uma conversa bacana sobre a carreira dele e a atual produção de quadrinhos no País. Sem falar que, vai, comer a trabalho não é mal. O prato que aparece fumegando na foto é o bibimbap, uma espécie de risoto de origem coreana servido numa pedra superquente, cujos ingredientes são misturados só na mesa e têm de ficar descansando um tempo até formar uma crosta (o braço aí é o da garçonete).

Só aí eu soube que o Beyruth sempre faz uma ilustração com pincel quando dá um autógrafo. O fotógrafo Tiago Queiroz e eu acompanhamos passados a evolução do desenho abaixo, coisa fina.

Da conversa, saíram no Caderno 2 os trechos abaixo.

***

Autor da Elogiada Necronauta, escolhida para distribuição em escolas públicas, o quadrinista é finalista em três categorias do HQMix pela graphic novel Bando de Dois

Raquel Cozer – O Estado de S.Paulo

Você estreou em HQs com histórias curtas (Necronauta) e passou à graphic novel (Bando de Dois). É muito diferente de fazer?

É, sim. Dá para traçar paralelo com o cinema, pensando em curtas e longas-metragens. A trama curta exige concisão, algo que funcione com pouco, mas a longa tem a curiosidade que é criar um esqueleto narrativo e ir povoando com cenas como se fosse trabalho de arqueologia, de reconstituir o dinossauro, até os personagens ganharem vida. Por acaso, agora estou trabalhando de novo com histórias curtas (no Necronauta 2), mas minha ambição está na história longa.

Como foi ter sua estreia em graphic novel indicada agora em três categorias do HQ Mix?

O melhor foi ser indicado pelo roteiro, porque há certo preconceito com desenhista que roteiriza. Na verdade, quem desenha e escreve tem a faca e o queijo na mão, pode fazer o roteiro de outro patamar. Nas pré-indicações do HQ Mix eu aparecia nas categorias desenhista e álbum, mas não na de roteirista. Se o álbum como um todo é bom, como pode o roteiro não ser? Leitores reclamaram na internet e fui incluído na lista final. O prêmio cria a prévia justamente para correções como essa.

O Necronauta, uma espécie de história de super-herói, foi escolhido pelo governo para distribuição em escolas. É uma HQ que possa ensinar algo a crianças?

A questão é menos poder ensinar algo e mais o fato de incentivar a leitura. Os livros selecionados pelo PNBE (Programa Nacional de Biblioteca da Escola) não são paradidáticos, estão lá para criar o hábito de ler obras originais. Se o Necronauta fizer isso, terá sua missão cumprida.

Como vê a tendência entre editoras de, por interesse em compras pelo governo, lançar adaptações de clássicos da literatura?

Depende muito da qualidade da HQ. Se a adaptação é muito benfeita, se respeita a obra original, como as do Spacca, será um bom cartão de visitas e estimulará a pessoa a procurar a obra original. Mas, se for um trabalho meio malandro, feito apenas para entrar em listas de compras, existe um perigo aí. Pode acabar servindo como desculpa para não se ler o texto original. De qualquer forma, muita coisa boa vem surgindo também graças a esse interesse maior do mercado nos últimos anos. Dá para fazer uma analogia com esporte: se você investe numa certa estrutura, consegue revelar talentos.

Você estreou em HQs com histórias curtas (Necronauta) e passou à graphic novel (Bando de Dois). É muito diferente de fazer?

Tiago Queiroz/AE
Tiago Queiroz/AE

É, sim. Dá para traçar paralelo com o cinema, pensando em curtas e longas-metragens. A trama curta exige concisão, algo que funcione com pouco, mas a longa tem a curiosidade que é criar um esqueleto narrativo e ir povoando com cenas como se fosse trabalho de arqueologia, de reconstituir o dinossauro, até os personagens ganharem vida. Por acaso, agora estou trabalhando de novo com histórias curtas (no Necronauta 2), mas minha ambição está na história longa.

Como foi ter sua estreia em graphic novel indicada agora em três categorias do HQ Mix?

O melhor foi ser indicado pelo roteiro, porque há certo preconceito com desenhista que roteiriza. Na verdade, quem desenha e escreve tem a faca e o queijo na mão, pode fazer o roteiro de outro patamar. Nas pré-indicações do HQ Mix eu aparecia nas categorias desenhista e álbum, mas não na de roteirista. Se o álbum como um todo é bom, como pode o roteiro não ser? Leitores reclamaram na internet e fui incluído na lista final. O prêmio cria a prévia justamente para correções como essa.

O Necronauta, uma espécie de história de super-herói, foi escolhido pelo governo para distribuição em escolas. É uma HQ que possa ensinar algo a crianças?

A questão é menos poder ensinar algo e mais o fato de incentivar a leitura. Os livros selecionados pelo PNBE (Programa Nacional de Biblioteca da Escola) não são paradidáticos, estão lá para criar o hábito de ler obras originais. Se o Necronauta fizer isso, terá sua missão cumprida.

Como vê a tendência entre editoras de, por interesse em compras pelo governo, lançar adaptações de clássicos da literatura?

Depende muito da qualidade da HQ. Se a adaptação é muito benfeita, se respeita a obra original, como as do Spacca, será um bom cartão de visitas e estimulará a pessoa a procurar a obra original. Mas, se for um trabalho meio malandro, feito apenas para entrar em listas de compras, existe um perigo aí. Pode acabar servindo como desculpa para não se ler o texto original. De qualquer forma, muita coisa boa vem surgindo também graças a esse interesse maior do mercado nos últimos anos. Dá para fazer uma analogia com esporte: se você investe numa certa estrutura, consegue revelar talentos.